Inconformado com a rigidez do controle de tempo, esse criativo e inescrupuloso damista resolveu, a exemplo do titã mitológico grego, Khronos, apoderar-se do domínio do tempo. Transferiu, dos tabuleiros, esse seu estilo até mesmo para vida, quando as circunstâncias lhe fossem favoráveis, ou, quando estas eram adversas, sempre buscou espertamente alguma forma de desestabilização como estratégia de alterar tudo que estivesse aparentemente definido.
Especialista em golpes e ciladas de abertura, vencia com facilidade os menos experientes, mas era talentoso em criar complicações táticas para os experts. Seu estilo, numa linguagem damística, era o tático.
Por muitos anos, um damista paulista recorreu a uma criativa atitude desonesta. O gosto pelo desafio de alterar o status quo – situação atualmente estabelecida – exerce um estranho domínio sobre alguns, especialmente os revolucionários e, por outro lado, os oportunistas de plantão, estes sempre motivados pela Lei de Gérson, cuja concepção – explicação para os mais novos – é de que, na vida, a ideia é levar vantagem em tudo. Existem até normas oficiais que regulamentam essas situações, ainda que todas as normas parecem ter sido inventadas para ser burladas. No caso do problema ser notado, em competições mais formais, chama-se o árbitro e alguma medida saneadora será aplicada, com a devida correção do tempo. Em tempo, o tempo (sem trocadilhos) é tão relativo que para damistas de alto rendimento não vale a máxima: “Time is money”.Īlguns relógios, porém, principalmente os analógicos, apresentam defeitos que podem eventualmente prejudicar ou favorecer um dos competidores, quando esse problema não é percebido. Quanto a isso, é importante lembrar que o tempo psicológico decisivamente não corresponde ao tempo físico. Alguém mais crítico poderia dizer: “Oras, o tempo é igual para os dois damistas, não havendo assim nenhuma injustiça”. Não é fácil, por exemplo, encontrar uma sequência de dez, vinte lances, em menos de trinta segundos, ou menos. Com o relógio não foi diferente.Ī pressão exercida pelo tempo exige nervos de aço dos competidores. Essa é a dialética das estratégias humanas. Mas, como já é de domínio público, toda solução gera novos problemas.Ī propósito, jogar damas também é uma forma de solucionar problemas que antes, do início da partida, não existiam. Quando um jogador, ao finalizar sua jogada no tabuleiro, aciona o seu mecanismo de tempo, imediatamente o andamento de seu tempo é interrompido e o tempo passa a correr apenas para o oponente. Cada jogador, com o controle específico no relógio, dispõe de um tempo convencionado para jogar a partida. O relógio com dois mostradores veio para solucionar o problema.
No passado, um jogador chegava a demorar horas, ou um dia todo, segundo alguns registros, para fazer até mesmo um único lance, ora por preciosismo, ora pela complexidade de uma posição, ou até mesmo como tática antiética para desestabilizar o adversário.Ĭriou-se, por isso, necessidade de se coibir esses abusos. Figura obrigatória nas competições, o relógio de damas cria dificuldades adicionais para os jogadores, porém sua utilização é imprescindível.